Friday, February 23, 2007

Feminismo!

E os olhares imaginam amores,
Relicários de intensa alegria;
São apenas lugares
Onde o homem mora.

Nu noutros andares
Esse homem salta
Pra uma sorte
Que só ele desconhece.

É apenas um beijo o que entorpece?
Somente a tarde é que anoitece?

O estupro, o latrocínio, o infanticídio...


Do cristianismo ao islamismo

Do paganismo ao Zen-Budismo
O homem sempre foi
Laranja podre.

Thursday, February 22, 2007

"Ela me vestiu no robe e me jogou na cama, oba, mais uma que sabe o que quer, eu me deixei levar, ela entrou com uma chupada maravilhosa, coisa de profissional, eu olhava aquilo e pensava que era bacana saber quanto custam coisas assim, pois as namoradas costumam mandar contas lacradas cheias de exigências absurdas. Mas tive uma recaída recorrente, falei que tinha inveja do namorado dela por receber uma língua daquelas sem a camisinha, ela riu sem tirar o pau da boca, eu vi poesia nisto. Eu vejo poesia sempre em coisas assim, por isso prescindo de ler a maioria dos poetas."
Esse fragmento foi tirado dum interessantíssimo conto chamado Diana, do Duda Bandit. Quem quiser ler por completo é só acessar: http://deitandocabelo.blogspot.com/ e aquele mesmo abraço!

Thursday, February 15, 2007


















(Foto:Jorge Ferreira e Anna Moosley)
Quando pisei em Cachoeira estava completamente bêbado. Pisei, olhei e notei que a história realmente existia e acontecia ali, uma história bem diferente daquela que ensinam nas escolas e universidades.
Tava passando mal, tínhamos vindo de Feira de Santana numa lotação e o cheiro de suor e cachaça junto com o balançar do carro não eram coisas interessantes para três velhos amigos que acabavam de beber cerca de 32 cervejas.Não sei porque, mas era agradável estar naquela cidade.Era dia de festa, a festa da boa morte.Antes de irmos à casa de Quinho eu perguntei-lhe:
_Porque boa morte?
_A comunidade da boa morte vem desde a época da escravidão onde os negros alforriados exibiam suas jóias e cultuavam Nanã ao invés do culto á Nossa Senhora – Ele falava enquanto enrolava o seu cabelo rastafári –e ali está o velho Paraguaçu, donde se escoava o fumo na época colonial. Do outro lado está São Félix, é só atravessar a ponte.
Que ponte, que rio e que arquitetura incrível! Estar naquela cidade merecia um brinde e logo propus a idéia, mas Quinho foi dizendo:
_Vamos deixar essas coisas em casa, lá tem cerveja e outras biritas.
Em sua casa conheci Dona Rita, uma pessoa muito agradável, talvez a mais agradável entre as mães dos meus amigos. Conheci também o seu irmão mais novo e sua irmã Marina de dezenove anos que me deu literalmente água na boca, mas o desgraçado foi logo interpelando:
_Nem encoste que ela tem namorado - Com isso, eu deixei o meu galanteio que viria a seguir de lado e abri uma cerveja. Dona Rita saiu e pude ficar a vontade pra enrolar um baseado de Haxixe. Juvenal, nosso amigo paulista que ainda não tinha entrado na história, mas que veio conosco de Feira berrou:
_Esse haxixe é do veneno, agente vai ficar loucão - O sacana falava com o sotaque mais paulista que já pude ver na vida, era quase uma caricatura de sotaque paulista.Ocorreu um problema na torneira da pia da cozinha e Juvenal disse:
_Deixa que eu conserto - Ele sabia fazer tudo. O desgraçado era mecânico, eletricista, encanador, artesão, motorista, professor de português, fazia velas aromáticas, pedreiro, cozinheiro, carpinteiro, pintor e por aí vai. Teve que fazer de tudo na vida pra sobreviver no subúrbio paulistano. Só não me perguntem como ele foi parar em Feira de Santana.
Saímos de casa, fomos fumar o haxixe num casarão que pensava que estava abandonado e Quinho me disse:
_Aqui é que funciona o arquivo municipal, estamos fumando na história de Cachoeira. Vamos fazer silencio, a policia já sabe que a galera anda fumando aqui á noite - Ele puxava tanta fumaça que pensava que ia explodir. Antes de terminar o baseado já estávamos completamente chapados e ao ouvir um barulho de carro que se aproximava, pulamos um muro de cerca de três metros temendo que fosse a polícia. Imaginem ser pego pela polícia de uma cidade que é patrimônio histórico da humanidade por estar fumando no local onde se encontra boa parte dessa história. Não seria boa coisa.
Descemos a ladeira e fomos parar no Pouso da Palavra. Um daqueles lugares onde artistas gostam de se reunir para ouvir música, declamar poesia e expor obras de arte. Gostei muito das telas de Suzart e das poesias de João de Morais Filho e Damário da Cruz, mas não estava muito a fim de conhecer artistas ou obras de arte, o que eu realmente queria era uma morena cinematográfica que conversava com um daqueles idiotas que gostam de sorrir para tudo e para todos e eu pensei: “será que ela está com este inseto?”.Vou tomar uma cerveja enquanto tento descobrir.
Após meia dúzia de cervejas e duas cachaças fui descobrir. Nos fundos do local tocava uma banda de reggae e o reggae da cidade é o melhor do estado. Quinho já beijava uma linda morena enquanto eu procurava a que tinha me deslumbrado. Ela dançava e todos dançavam á sua volta como chacais ensandecidos. Dei um gole, parei a sua frente e disse:
_Preciso que venha comigo agora, quero falar contigo com urgência. Ela me olhou desconfiada e topou. Fomos á ala de exposições, eu olhei em seus olhos e comecei a declamar a primeira parte de A canção desesperada de Pablo Neruda. Á cada verso eu ia me aproximando, ao chegar a ultima estrofe eu já sentia a sua respiração e quando disse tudo em ti foi naufrágio, nossos lábios se tocavam. Abençoado seja o grande poeta chileno. Ás vezes é preciso um pouco de fé, nem que seja fé na literatura. Para momentos como este é que serve toda a leitura de uma vida. Ela sorriu e disse:
_Você poderia dizer o seu nome, pelo menos? O meu é Adriana – Ela falava sorrindo timidamente enquanto alisava os cabelos. Era magnífica. Boca carnuda, olhos puxados, cintura fina, bunda grande, pernas grossas e seios que cabiam em minhas mãos. Neste momento não estava interessado em sua vida ou gosto pessoal, eu desejava me afogar entre suas pernas. Neruda estava certo; “tudo em ti foi naufrágio”.
_ Meu nome é Antonio Diamantino, mas me chamam de Tom. Foi mais que um prazer; foi a eterna volúpia.
_Eu tenho namorado, mas ele mora em Salvador. Agente não pode ser visto juntos aqui. Você tem preconceito com candomblé?
_Absolutamente!
_Vai rolar uma festa de caboclo em São Félix, é só atravessar a ponte e seguir os tambores, você vai?
_Iria ao inferno se preciso fosse - e naquele instante, eu iria ao inferno com certeza, enfrentaria legiões demoníacas e negaria tudo em que acredito. Vou beber mais algumas e seguirei os tambores rituais.
Encontrei Nemar, um velho amigo da universidade que sorriu com sua cara sórdida e disse:
_Tom em Cachoeira, aqui não é lugar pra você colher material pra sua literatura depravada meu velho. Tom em Cachoeira – ele iria repetir essa frase o resto da noite.
_Gostei de sua cidade, o mal é que eles querem colocar o valor da arquitetura barroca no preço da cerveja.
_Você é turista. Branco e de fora aqui é gringo e todo gringo tem que se fuder.
_Vai rolar uma festa de caboclo em São Félix, você vai?
_Claro que vou. Se você for vai ser o único branco do lugar e quando alguém perguntar onde é o sanitário, eles vão responder: tá vendo aquele branco?É só dobrar a direita - O sacana falava e morria de rir dizendo -Tom em Cachoeira.
A conversa estava muito boa, mas os beijos de Adriana estariam melhores. Ah!...não tenha dúvidas de que estariam. Deixei Nemar pra trás, tomei uma dose de abaíra e fui em direção a minha ponte que parecia separar dois mundos: Um mundo sozinho e um mundo com ela. Até chegar na ponte lembrei-me da terceira estrofe de As cismas do destino, onde Augusto dos Anjos diz:

“Lembro-me bem. A ponte era comprida,
E a minha sombra enorme enchia a ponte,
Como uma pele de rinoceronte
Estendida por toda a minha vida!”

A ponte era realmente cumprida. Toda de ferro com o piso de madeira. A estrada de ferro passa por esta ponte construída no século dezenove e quando os carros trafegam por ela, temos a sensação de que as tábuas do piso irão se desprender e que iremos cair nas águas profundas do Paraguaçu. Eu não poderia morrer naquele instante, não sem antes ter provado todas as delícias daquela fêmea. Com todo o meu medo de altura atravessei a ponte e cheguei em São Félix. Apurei os ouvidos e comecei a ouvir o som primitivo dos referidos tambores rituais. Eram cerca de duas da madrugada e eu seguia por uma rua deserta envolta em neblina ás margens do Paraguaçu. Depois de andar cerca de um quilometro, consegui visualizar uma casa no alto do morro de onde vinha o som que me hipnotizava.
Subi uma escada escavada no próprio terreno e cheguei a uma casa humilde onde as pessoas conversavam á porta. Os tambores estavam cada vez mais fortes e quem os tocava estava numa espécie de transe enquanto homens vestidos com trajes femininos dançavam, bebiam, fumavam, gritavam, cantavam e rodavam ao som dos atabaques e de cantigas populares bem peculiares. Estes homens incorporavam o caboclo. Alguns usavam cocáres indígenas e os ofereciam a alguns anciãos que sentavam em volta com aspectos sacerdotais. Olhei em volta e nada de Adriana. Sem tomar conhecimento, passei pelo ritual e fui aos fundos da casa onde estavam Moreira e Nemar. Moreira olhou-me e disse a sua velha e carinhosa saudação:
_Fila da puta!Como é que você veio parar aqui, num terreiro de candomblé, de madrugada, em São Félix?
_Vim seguindo o rastro feminino, mas ela não está aqui. Nemar, como você conseguiu chegar antes de mim? -Ele caiu na gargalhada depois de minha pergunta e disse:
_Este lugar é só pra convidados menino ousado, mas pode ficar, você é meu convidado.
No mesmo instante Moreira surgiu com uma cerveja e três copos. Encheu os copos e perguntou:
_Quem é essa mulher que você ta procurando?
_ O nome dela é Adriana; morena e linda de morrer.
_ Ela estava de jeans, olhos orientais e um sorriso encantador?
_Você a conhece?
_Não, mas deve ser esta que está sorrindo atrás de você.
_Tava me procurando gatão?- ela falava com a expressão mais maliciosa que já pude observar numa mulher. Muita malicia para uma menina nos seus dezoito anos. Adoro o cinismo e a malícia das mulheres.
Ela passou a língua nos lábios e disse:_Vamos dar uma volta? - Esqueci os meus amigos, a cerveja e todo o resto. Peguei em sua mão e desci para a margem do rio onde transamos em pé sobre uma rocha com o precipício a dez centímetros do meu calcanhar. Se morresse seria uma morte sublime. Ainda bem que não morri e pude contar esta história.
Parece que as coisas inesperadas são as mais saborosas, as mais preciosas. Eu nem perguntei se ela tinha gostado da poesia e ela estava ali, nua, belíssima, decidida e gemia como gemem os astros, ela gemia como gemem as estrelas. Minha sorte foi ter bebido muito e pude demorar o suficiente pra que tudo fosse inesquecível para os dois. Como uma garota de dezoito anos podia fuder daquela forma? Se ela não tiver talento nato deve trepar desde os dez anos ou não haverá explicação plausível que possa ao menos justificar toda aquela frenética competência.
Era algo bem peculiar e atraente o seu gemido, nada exacerbado e a lá filmes pornôs, tudo bem delineado como um labirinto de formas geométricas perfeitas onde eu não pudesse encontrar a saída. Ainda bem que gozei e depois do gozo as mulheres perdem um pouco o seu encanto.
Detesto chegar ao final dos meus objetivos. A conquista parece ser bem melhor que o ato consumado. Logo no instante em que cumprimos as nossas promessas, que realizamos nossos sonhos temos um certo orgulho, uma enorme satisfação em ter conseguido, mas depois o tédio é imenso e se o sonho é algo real é porque precisamos de outros sonhos. Mesmo que a reencontre, não terá a magia da primeira vez e iremos eternamente buscar aquela sensação primeira, aquele algo de enigmático que transformava a realidade num sonho. Tudo está acabado, amanhã ela não será mais um sonho. De agora em diante não há mais ilusões.
Até que ela é bem atraente mesmo dentro da fria rotina do cotidiano e do sonho acabado. Estou pensando essas coisas porque acabei de gozar. Amanhã sairei como um louco á sua procura, a procura de resquícios do meu sonho.
Ela terminou de se vestir e falou:
_Tenho duas perguntas pra te fazer. A primeira é se foi o que você esperava e a segunda é como vamos sair daqui?!
_Baby, foi exatamente como eu esperava e eu esperava a amplitude, eu esperava o infinito. Sei que nem tudo o que desce sobe, mas nós vamos sair daqui e, se não sairmos, poderemos virar um casal de entidades mitológicas que vivem ás margens do Paraguaçu.
_Pare que você tá me assustando!
_Tô brincando, me siga! - escalamos algumas rochas e estávamos de volta a escadaria que levava ao terreiro. Ela sentou-se ao lado de uma senhora gorda que estava numa daquelas cadeiras destinadas aos pais e mães de santo.
Reencontrei Nemar e Moreira que bebiam e fumavam com o caboclo e Moreira recebeu um cocá da entidade. Colocou o cocá na cabeça e começou a dançar e a rodar. Nesse ínterim eu já estava bebendo na garrafa que a entidade me oferecia. A bebida era preparada com ervas e me deixou mais que louco. Bebíamos, dançávamos e fumávamos charuto quando o dia já raiava. Olhei para onde ela estava sentada e não a vi, procurei pela casa, no quintal e nem sinal de Adriana. Tava tão chapado que mal conseguia me equilibrar e terminei desistindo de encontra-la. Minha mente precisava acreditar que aqueles homens estavam realmente possuídos por entidades, se isso fosse uma farsa, a noite perderia o seu significado. Boa parte de cultura local perderia o seu sentido. Eu tinha que acreditar; era melhor que acreditar no concreto, no plausível. Aqueles homens humildes não precisavam mentir e enganar como os papas, padres, bispos e pastores. Algo ancestral corria em suas veias, algo inimaginável gritava em seus espíritos.
Estava realmente numa cidade barroca onde as pessoas vão do terreiro á igreja; do bordel ao confessionário.Uma cidade onde a historia não para nas edições dos livros didáticos nem nas fachadas das igrejas e sobrados seculares.
Nesse momento não via significação alguma em nomes como Reno, Nilo, Eufrates, Sena, Danúbio, Tigre ou Tietê. O que realmente sentia era o desfilar de toda a história e o naufragar de toda a magia nas águas turvas do rio Paraguaçu.